domingo, 30 de agosto de 2009

Sandra Werneck

A cineasta brasileira Sandra Werneck participou de um encontro com amantes de cinema ontem, dia 29, na Biblioteca Temática Roberto Santos. Antes da sabatina houve a exibição de seu primeiro filme de ficção, Pequeno Dicionário Amoroso (1997). Por favor, não me condenem por dois motivos: um, existe um ou outro spoiler de dois filmes para quem ainda não os assistiu na matéria; o outro são as fotos que foram tiradas de celular (muito melhor que o meu por sinal); até tinha levado a minha câmera, mas o ambiente escuro e o flash que vai direto na cara dos outros estragam tudo. Tenho que dar crédito à minha amiga Bozolina pelo trabalhão que ela fez naquele breu.

Os filmes de ficção
O início da carreira ocorreu na década de 1970 numa época em que faculdades de cinema ainda não existiam e, portanto, fez curso de direção na região do Parque Lage, no Rio de Janeiro. De lá, sua primeira película nasceu, filmada em Super 8. Já Bom Dia Brasil, o primeiro documentário, viria a ser lançado em 1976. Nesse período e nos anos seguintes, Sandra participou de outras produções sendo assistente de direção. “Nessa época um trabalhava no filme do outro de graça”, afirmou. Mais tarde, seguiu como diretora de comercialização de documentários e curta-metragens da Embrafilme (1984-1985) e diretora da Lumiar Produções Cinematográficas (1986-1989), além de realizar meia dúzia de documentários de curta-metragem.

Eis um ponto em questão: o primeiro trabalho de ficção somente realizou-se quase 20 anos depois de Bom Dia Brasil. Por quê? “Eu fiz uns dez documentários antes de realizar Pequeno Dicionário, pois é muito complicado fazer um longa [metragem] logo de início,” ela explica. “No documentário tem que se estar muito atento para a emoção do entrevistado. Isso me ajudou a tratar cenas com atores, sem monopolizar nada.”

A cineasta avalia que “Pequeno Dicionário surgiu de uma história autobiográfica, pois estava me separando e precisava falar sobre esse assunto.” Um dos motivos para essa representação está no fato do rumo distinto dado aos personagens centrais. “Eles não podiam ficar juntos; precisavam viver a vida deles”, consola-se. Inusitadamente, a atriz Andrea Beltrão ficou grávida quando começaram as filmagens. Apesar da espera de nove meses para o retorno de sua protagonista, Sandra pôde retrabalhar o roteiro inteiro e viabilizou a captação de novos financiadores para o projeto. Após a estréia, a obra atraiu pouco mais de 400 mil espectadores o que uma representatividade para o cinema brasileiro no início da Retomada. “Lá fora, meus filmes venderam muito bem. Tanto que um amigo me mandou uma foto do pôster de Pequeno Dicionário estampado em alemão numa sala de cinema”, completa a diretora.

Posteriormente, Sandra Werneck se preocupou mais com a narrativa de uma estória do que a questão amorosa inserida nela. Surgia Amores Possíveis (2001), um fantasia de amor cujo personagem busca sentidos para sua futura vida em mundos paralelos sendo apenas um real. Por este trabalho, a cineasta se deparou com o Festival de Sundance. Segundo ela, “quando ganhei lá, não acreditei! Minha filha me empurrou para o palco e eu não queria sair do banco”. Na categoria de Cinema Latino-Americano, o prêmio foi dividido com o filme mexicano Sem Deixar Pistas, de María Novaro.

Três anos depois, Cazuza – O Tempo Não Pára tornou-se seu próximo projeto, contudo, não participou da produção. “Sempre sou produtora e diretora dos meus filmes, mas neste fui diretora contratada”, explica. Os onze tratamentos dados ao roteiro precisavam de uma marca real nas cenas, portanto, era necessário “alguém com problemas reais” para tratar deste personagem. Ela conta: “Não podia colocar o Cazuza como a Xuxa; pela Globo Filmes o filme seria muito mais careta.” A despeito da grande produção global, o público compareceu em massa às salas tornando o filme o maior sucesso do cinema brasileiro em 2004, com mais de três milhões de espectadores – Olga estava pouco atrás.

Falando de realidade
Durante a sabatina, o documentário Meninas acabou tendo papel fundamental na discussão ora pelo pouco agrado às massas ora pelo caráter substancial de ensinar e alertar. A proposta está na exposição do cotidiano de três garotas adolescentes grávidas que vivem na periferia ao longo de um ano. A região escolhida foi o Rio de Janeiro pela facilidade da produção, mas houve entrevistas em outros estados como Minas Gerais, Paraíba e São Paulo. Além de voltar o gênero que alavancou sua carreira, Sandra avalia que este “filme mostra uma realidade; é um instrumento que quero que passem em todas as comunidades possíveis. Eu queria entender a vida dessas meninas”.

“Mandei Meninas para todas as Secretarias de Educação. Ninguém me respondeu. Em compensação as professoras do Maranhão, Amapá e outros lugares requisitaram o vídeo. Tanto que foi um dos filmes mais vendidos da [distribuidora] Vídeo Filmes”, argumenta a cineasta. “Devia passar em todas as escolas. É um filme educativo, como outros documentários que fiz.” E completa: “Você vê com graça. Eu sou carioca, e às vezes, olho para uma comunidade e vejo que as pessoas são muito mais felizes.”

O documentário chamou a atenção de Sandra para criar uma ficção sobre essa realidade em Sonhos Roubados, a ser lançado em 2010. Para isso, usufruiu das histórias e da interpretação de atores amadores. Isso proporcionou a diretora uma maneira nova de ver o trabalho dessas pessoas: “Eles dão um frescor, sem vícios, tem algo verdadeiro no que fazem. A Marieta Severo consegue ser nova a cada papel, mas muitos atores não conseguem. Alguns se repetem o tempo todo, passam a ser eles mesmos.”

Deste modo, quanto a este aspecto, Sandra amplifica os experimentos trazidos pelos intérpretes. “Gosto disso, das características, das atividades. Não tenho amarras. Nunca diga o que quero; nunca marco o ator, pois aqui [o set] é seu ambiente.” E emenda: “É muito melhor que ele traça o que tem que fazer do que você estabelecer.” Por isso, ela prefere que o papel certo da direção esteja na colaboração. “Eu mesma faço os testes.” E “quando escrevo um roteiro, penso em algumas pessoas. Nem sempre as uso; muitas vezes deixo em aberto”. Um exemplo está no papel de Daniel Dantas em Sonhos Roubados: “ele ficou ótimo de tio pedófilo porque ele tem cara de bonzinho.”

Dentro deste panorama, ela faz uma decupagem mental prévia para as cenas a serem filmadas que, às vezes, batem contra a fotografia de Walter Carvalho (co-diretor de Cazuza), seu principal parceiro no cinema. Com ele lá, Sandra arrazoa que não precisa se preocupar com a fotografia. Mas de acordo com seu senso, as produções são morosas: “Três anos fazendo a mesma coisa é um saco. Demora mais tempo pra conseguir dinheiro do que filmar.”

Por outro lado, Sandra apela para projetos singulares. Seus filmes novos nunca têm a intenção de repetir os já realizados. Não à toa, sua fonte de pesquisa se restringe a cineastas como Lars von Trier, Pedro Almodóvar, Federico Fellini, Pier Paolo Pasolini. “Todos eles juntos moldaram meu olhar sobre cinema. Quando fiz Cazuza, assisti E Sua Mãe Também como referência”, revelou. Além disso, “meus trabalhos tem sempre algo psicológico”. E como declaração final [literalmente, foi uma das últimas coisas que disse]: “Acompanho tudo em meus filmes, até o cartaz que será lançado. É como um filho; eu tenho de cuidar.”

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Por que a Xuxa recebeu uma homenagem no Festival de Gramado?

Infelizmente eu não tenho a resposta. Desde que ouvi falar do Festival de Gramado, percebi que muitos filmes participantes são, em sua maioria, esquecidos – observe, não são esquecíveis. Quem se lembra de Cassy Jones: o Magnífico Sedutor? Luís Sérgio Person recebeu um prêmio de diretor por esta obra. Ou, que tal, For All - O Trampolim da Vitória? Este ficou com o Kikito máximo de melhor filme em 1997 quando a produção cinematográfica brasileira ainda (re)engatinhava.

E, diante de tal posição pouco memorável para o festival – além de quem participa dele –, uma comissão resolve promover categorias especiais, com intuito de homenagear célebres artistas que auxiliaram o nosso cinema a ser o que é. Renato Aragão recebeu uma dedicatória por sua enorme contribuição ao lado do grupo Os Trapalhões sendo que este comediante é tão ilustre quanto seu antecessor popular, o grande Amácio Mazzaropi. Tá, mas por que a Xuxa merece tal honraria?

No portal G1 (olha só, da Globo...) está escrito o seguinte:

Segundo Alemir Coletto, presidente da mostra gaúcha, esse tipo de reconhecimento aos filmes infantis demonstra o “espírito democrático” do festival. “Ao longo de sua carreira, Xuxa foi uma atriz e produtora que ajudou a popularizar os filmes nacionais. O festival se engrandece de poder contar com sua presença como celebridade e ícone do nosso cinema”.
Coletto explica que a comissão organizadora da mostra escolhe os homenageados “por sua contribuição ao cinema brasileiro, independente do gênero dos filmes”. Já os filmes da mostra competitiva são selecionados por um grupo de especialistas. Por isso, uma produção infantil dificilmente concorreria no festival.
“É importante não confundir homenagem com mostra competitiva. Os filmes selecionados para a competição são determinados por um júri especializado, que leva em conta diversos elementos. A homenagem é um registro das personalidades importantes para a engrenagem do nosso cinema, independente das funções que desempenhem na frente ou atrás das câmeras”, explica o presidente.

A melhor resposta a isso foi escrita por Pablo Villaça em seu blog:

Surpreso com a notícia, faço uma rápida busca e descubro que a justificativa por trás da homenagem é o fato da Rainha dos Baixinhos ter levado "36 milhões de pessoas" aos cinemas com seus filmes. E, para mim, isto ajudou a solidificar uma opinião que muitos já manifestaram em voz alta: o Festival de Gramado acabou.
E mal posso esperar pela homenagem a Michael Bay no Oscar 2010.

Não tenho como discordar do editor e crítico do Cinema em Cena. Inclusive, imaginei o mesmo lance sobre o grandioso diretor de Transformers. Em que a Xuxa contribuiu ao cinema brasileiro? Ela não interpretou personagens, mas a si mesma. Seus filmes maniqueístas e despropositais não encantam pessoas em si, mas enchem a cabeça alheia de pensamentos vazios de uma moça, ou melhor, de uma mulher adulta querendo ser princesa. Isso é um benefício?

Daria um crédito a Lua de Cristal por ser parte da minha infância, contudo, em termos de história nada mais é do que uma redundante alegoria da apresentadora; um produto bem vendido e, por isso, tornou-se o maior sucesso de público em 1990. E quanto aos outros? Super Xuxa Contra Baixo Astral (1988) foi uma cópia chinfrim e paupérrima d’O Labirinto (1986); e também conta com uma das piores canções da época o que até enaltece o filme de David Bowie postulando-o a uma obra-prima.

Depois de Lua de Cristal, a Rainha dos Baixinhos ficou nove anos sem lançar outra investida de sua humilde soberba na grande tela. Quando chegou 1999, Xuxa Requebra estourou nas bilheterias brasileiras e deu início a uma série de trabalhos sem qualquer ideologia, eficácia cinematográfica ou comprometimento lúcido com uma interpretação. Sabe o que é interessante? Nos Estados Unidos, Michael Bay faz o mesmo! Sabe o que é pior? Ele também ganha um grana preta fazendo isso! Porém, existe uma diferença: no presente momento, nenhum representante do Globo de Ouro ou da Academia de Artes Cinematográficas de Hollywood se manifestou quanto a conceder tal honraria a esse intrépido diretor. Na verdade, Edward D. Wood Jr. mereceria muito mais uma homenagem (nem que fosse póstuma!) do que Bay. Quer saber, Arnold Schwarzenegger merece mais o tributo.

Houve um vazio nesse festival. Para preencher o espaço, a comissão cometeu a atitude infame enfiando um pobre conceito de cinema. Pelo menos, conseguiram ter atenção popular apesar de não ser da melhor maneira.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

John Hughes: 1950-2009

Apesar de ter ocorrido ontem vi a notícia apenas hoje: John Hughes morreu de ataque cardíaco aos 59 anos. Muita gente nem vai saber quem o é homem assim pelo nome, mas ele foi um mestre em condicionar aos adolescentes um papel mais inteligente na vida mundana. Seus filmes são representativos para a geração dos anos 80 embora atraiam qualquer um a reprisá-los inumeráveis vezes só para sentir o gostinho da nostalgia juvenil.

De sua mente saíram obras carismáticas como Gatinhas e Gatões, Mulher Nota 1000, Esqueceram de Mim e A Garota de Rosa Shocking – os dois últimos apenas como roteirista. Fez seu público fiel se emocionar com Clube dos Cinco e literalmente torcer pelo passeio extravagante de Ferris Buller em Curtindo a Vida Adoidado. Ambos podem sim serem levados à definição de obras-primas. Talvez nem Kubrick, Scorsese, Bergman, Godard ou até mesmo Spielberg capturassem o espírito adolescente daquela forma tão singela e explosiva sem perder a inocência da situação ou do diálogo.

Nesses últimos anos, John Hughes distanciou-se do cinema. Seu último filme como diretor foi lançado em 1991 (Curley Sue: A Malandrinha); o roteiro final veio Meu Nome é Taylor, Drillbit Taylor, com Owen Wilson em 2007. Um expoente do cinema que cresceu, mas nunca deixou de compreender a juventude, que, às vezes, é mesmo uma rebelde sem causa.