quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Jeremy

Sempre vi o grunge como uma fúria silenciosa, aquela que não dá ultimatos e, depois de certo tempo, explode com tanta violência que não sabemos demonstrar onde estava o perigo inicial. Algumas vezes, esse estouro nem é externo, mas interno, o que replica até nas confusas circunstâncias da morte de Kurt Cobain. O suicídio passaria a se estabelecer como implosão de sentimentos e devaneios autodestrutivos.

Tendo esse tipo de representação introspectiva à lá big bang, a banda Pearl Jam lançou em 1991 o álbum Ten; nele havia canções pesadamente intrincadas e, mais tarde, bem sucedidas. Uma delas era Jeremy. Poucas canções conseguem buscar a biografia de alguém e dignificá-la numa melodia – um caso esplêndido é Hurricane, de Bob Dylan –, mais difícil ainda está no fato do personagem principal ser um garoto desiludido que se mata em sala de aula na frente de colegas. Sua vida pôde ser curta, mas seu ato ecoa no tempo.

No fato real, Jeremy Wade Delle é o próprio desespero enquanto vive sua juventude: quieto, praticamente sem amigos, supõe-se sofrer bullying. Ninguém lhe dá a mínima e ele resolve “satisfazer” a si mesmo através de um ato grandioso. Como o próprio vocalista Eddie Vedder explicou que a inspiração da música “veio de um pequeno parágrafo num jornal que significa você se matar, realizar um grande sacrifício e obter sua vingança. Tudo o que se pode conseguir no fim é um parágrafo no jornal.” Segundo Vedder, ele também teve um colega de escola que tentou uma espécie de reconhecimento com um tiro, mas este ato não matou ninguém.

A inspiração constou numa nota jornalística, mas Jeremy foi (e é) uma canção polêmica. Invariavelmente, diversos desses apelos juvenis tornam a surgir com os anos em todo o lugar. Em escala internacional pode-se considerar o caso da chacina em Columbine o maior – capaz até de Vedder dizer “De novo!” toda a vez que acontece isso. E essa atemporalidade da música que, em suma, precisava de um apelo visual.

O clipe não negligencia a letra, pois invoca uma análise, busca por respostas. Um garoto que enfia uma .357 Magnum na boca e explode sua cabeça na sala de aula não pode ser tratado com um espanto simplista. Este completamente ignorado pelos pais não consegue criar enraizamento social, pois não há estímulos. Jeremy equilibra-se diante de um abismo sem perspectivas nos subúrbios intolerantes aos esquecidos mais fracos. As imagens confrontam o desespero deste personagem, sua violência contida, suas más idéias com relação à própria vida.

O vocalista atribuiu o seguinte: “64º [Fahrenheit] e nublado em um bairro suburbano. Este é o início do vídeo e ao seu final. Nada muda. O mundo continua enquanto você foi embora. A melhor vingança é viver e provar a si mesmo sendo mais forte que aquelas pessoas. E então você pode voltar.” Ou seja, a polêmica atribuída não se vincula ao alerta (não intencional, talvez) que o Pearl Jam demonstrou, mas a incômoda situação de assistir uma pirotecnia visual sem atenção.


Se não funcionar, clique aqui.

Existe uma primeira versão deste clipe que a gravadora não aceitou. Realizado pelo fotógrafo Chris Cuffaro e de caráter independente, o vídeo é mais escuro e obviamente simples, contudo há neste trabalho uma ênfase interessante de isolamento profundo que pode evidenciar o caráter sinistro dos pensamentos de Jeremy.

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