terça-feira, 14 de julho de 2009

Enlatados

A arte em si possui um viés de propagar idéias com sabedoria e criatividade. Dentro de uma cultura, engrandece seus aspectos sociais diversificando a inteligência da comunidade, motivando-as como civilização prestigiada e influenciando os parâmetros artísticos do futuro. Na lista das artes, a sétima produz uma força econômica poderosa e não nega sua característica massiva, principalmente para os estúdios de Hollywood.

Certa vez, ouvi de meu chefe, dono de vídeolocadora, sobre os filmes estadunidenses o seguinte: estes não passavam de enlatados com produções fúteis para uma massa em busca de caça-níqueis; em contrapartida, dever-se-ia valorizar os filmes de arte, o cinema europeu e asiático etc. Não foi a única pessoa que já me falou isso, não será última e tenho de concordar com alguma coisa, afinal Hollywood cansa as mentes alheias com suas bombas.

Só que o cinema norte-americano buscou esta linha de produção fordista adquirindo um volume de lucro extorsivo através do merchandising. Tudo pode ser vendido e muitas vezes alguns filmes se pagam antes de estreiar. Igualmente, os Estados Unidos se nutrem dos conceitos e técnicas estrangeiras regurgitando-as como criações próprias. Se antes isso ficava mais à surdina para a grande massa, hoje é completamente disseminado entre ela. Ao final, todo o trabalho era vendido como uma lancheira, uma caneta ou um caderno em escala industrial.

Durante os anos 1930, os estúdios venciam a concorrência européia – em parte por causa da “fuga de mentes” na Alemanha e da conseqüente Segunda Guerra Mundial – e firmaram um terreno nos buracos das culturas forasteiras ao redor do globo. Isso durou anos e em muitos lugares sequer há uma produção no mínimo eficiente de cinema. Enquanto Brasil, Argentina e México fortalecem seus mercados, outros países da América Latina não conseguem avançar. Em outros continentes existe o mesmo problema.

Algumas nações afrontam esse poderio do mercado cinematográfico com estruturas mais fortes – França, China, Índia e Japão – e nestas os Estados Unidos têm mais dificuldades em arrasar a concorrência. Por quê? Além de se autovalorizarem culturalmente, essas nações jogam de igual para igual com o filme imigrante. Por exemplo, os chineses têm restrições fortíssimas com o cinema de fora sendo que apenas 20 cópias por ano conseguem sua introdução naquele mercado. Em outro caso, os indianos têm Bollywood e se satisfazem muito mais com sua indústria do que com a alheia. Ainda há o fato de que alguns blockbusters não pegam no Japão, afinal Batman: O Cavaleiro das Trevas levou uma surra do anime Ponyo em 2008.

Além disso, o apreço que Hollywood tem pelos sucessivos recordes de bilheteria leva a crer aos demais a sensação de querer participar desse bolo também. Ou de muitas outras fatias disponíveis. Aí entra a lógica de mercado, e isso vale para qualquer filme independente de sua origem. Um diretor pode não se preocupar em quanto seu filme irá arrecadar, mas ele quer público. Desta forma, o trabalho precisa ser vendido, pois é algo caro e muitos profissionais se esforçam para ter reconhecimento por ele. É praticamente a mesma coisa com o teatro ou a música.

Deste modo, os festivais de Cannes, de Sundance, de Berlim, de Toronto, de Veneza abrem as portas para a negociação entre produtores e distribuidoras. Depois de uma passagem nas telonas, esses filmes passam pelo processo seletivo das vídeolocadoras e do público. Ou seja, são vendidos porque estão incluídos dentro de um mercado e, portanto, são todos enlatados. Em decorrência disso, alguns transeuntes culturais dizem que os estrangeiros realizam filmes de arte enquanto cineastas hollywoodianos não; ou somente os norte-americanos sabem fazer cinema (sério, já ouvi ambas as frases). O apreço por este tipo de cinema é questão de gosto, mas o argumento além de impróprio e taxativo qualifica-se também como improdutivo e imbecil.

Quer dizer que se indianos copiam descaradamente um filme dos Estados Unidos (ou de qualquer outro lugar) não estão produzindo a mesma coisa? E a França lançando as continuações do sucesso Táxi? E o cinema brasileiro com Se Eu Fosse Você? E a enorme quantidade de filmes lançada todos os anos de várias partes do mundo dos gêneros drama, suspense, ação e terror enquadram-se no quê? Por outro lado, Fargo, Sangue Negro, Wall-E, 21 Gramas, Magnólia ou Os Excêntricos Tenembauns deixariam de lado sua classificação como “filme de arte” por serem norte-americanos?

Existe uma coexistência entre todos os gêneros possíveis nas prateleiras ou nas TVs por assinatura. Algumas obras nem poderiam se fixar num gênero específico. Enquanto Star Trek e Cloverfield se adéquam entre o cinema e a televisão, o diretor Steven Soderbergh tem um status quo de representação independente em todo o suja carreira, influenciado por conceitos de Jean-Luc Godard; há idéias oriundas do trash nos filmes de Robert Rodriguez, Quentin Tarantino e Peter Jackson assim como Akira Kurosawa fora de grande influencia conceitual a George Lucas, Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, entre outros.

É uma miscelânea de tudo. As fronteiras estão sumindo e se ainda não foram, minam-se elas através de YouTubes da vida. A imagem do cinema no mundo digital é um liquidificador cheio de filosofia, arte e idéias novas que se misturam a todo o momento. Dali surge uma surpresa e, como o antigo chocolate da Nestlé, está embalada num pacotinho pronto para a venda na esquina mais próxima da sua casa. Se para alguns é só mais um enlatado, para outros é trunfo da arte.

2 comentários:

  1. Thi,

    Vc escreve muito bem, mas as vezes o excesso de palavras incomuns dificulta o entendimento. Se essa é a linha que vc quer usar ótimo. Mas talvez um linguajar mais popular tornaria seu texto mais prazeroso!

    Ninguem mandou me passar o link! agora sempre vou passar por aki.
    beijos*

    ResponderExcluir
  2. Outra coisa (rsrs) muda a cor da frase do seu banner. O verde não da leitura...tenta o laranja ou azul...

    ResponderExcluir